terça-feira, 14 de agosto de 2012

Estações como pólos de desenvolvimento

Este trabalho foi apresentado pelos autores na 18a Semana de Tecnologia Metroferroviária da AEAMESP.
Resumo:
O trabalho apresenta um procedimento de avaliação das estações metroferroviárias como pólos promotores de desenvolvimento socioeconômico. Apresenta também um estudo de caso com as estações do metrô de Belo Horizonte da Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU.
Relevância:
O conhecimento, com base na centralidade, da vocação e potencial de cada estação em fomentar determinadas atividades, dá suporte para se alcançar a integração entre transporte e uso do solo, contribuindo para a criação de um ambiente auto-sustentável.
Descrição:
Para que uma cidade possa existir e realizar suas funções econômico-sociais, ela tem que estar estruturada com base em seu sistema viário e de transporte.
O sistema de transporte de uma cidade, por sua vez, compreende a coordenação de todos os modos e infra-estruturas de transporte à disposição da sociedade, estando aí incluídos os modos motorizados e não motorizados. Sendo assim, um sistema de transporte bem estruturado é aquele que está organizado de forma a atender as necessidades de deslocamento da sociedade pelo menor custo generalizado e ser ao mesmo tempo sustentável.
Nesta perspectiva, um sistema de transporte bem estruturado induz o desenvolvimento socioeconômico da região onde está inserido, na medida em que possibilita maiores fluxos de pessoas e mercadorias.
Assim, torna-se relevante coordenar o planejamento da infra-estrutura de transporte e do uso do solo com uma concepção que promova, além da integração entre modos de transporte, o desenvolvimento socioeconômico da região, de modo a se criar condições de sustentabilidade do sistema. Tal articulação é fundamental porque a disponibilidade de serviços de transporte influencia o processo e os padrões de expansão das áreas urbanas e define (ou reorienta) o uso do solo e sua ocupação. Planejamento urbano e planejamento de transporte têm que caminhar juntos.

No final do século XX, surgiram novas tendências no sentido de favorecer a organização do espaço urbano com base no seu sistema de transporte público e empreendimentos a ele associados, que vêm sendo chamados de TOD – Transit Oriented Development. Neste modelo se reforça as atenções na implantação ou revitalização de empreendimentos na área de influência do sistema de transporte público existente ou que se encontra em implantação.
No que concerne ao transporte público e particularmente ao transporte sobre trilhos, o local considerado ideal para as intervenções é o entorno das estações, onde se busca também dotar a área de outros requisitos que impliquem na diminuição das viagens por transporte individual de seus habitantes para outros pontos da cidade.
As estações metroferroviárias inseridas no espaço geográfico têm uma tendência natural de exercer um papel importante na relação do sistema de transporte com o ambiente urbano, e podem contribuir na implantação de projetos, uma vez que são focos de integração modal e canal de comunicação entre as duas regiões separadas pela via férrea. Por outro lado, a concentração de atividades socioeconômicas no seu entorno, tende a criar um tipo de uso do solo com características compactas. Esses aspectos fazem com que as estações se tornem candidatas a pólos de articulação do transporte com o desenvolvimento socioeconômico e elemento importante na estruturação e organização do espaço metropolitano.
As centralidades urbanas (concentração de bens e serviços) são identificadas a partir da demanda de transportes. No entanto, uma questão relevante diz respeito à distribuição dos equipamentos urbanos na estrutura urbana associada. Um corredor metroferroviário, por exemplo, corta o espaço urbano linearmente e tem a tendência de distribuir os equipamentos urbanos no entorno da linha e da estação, formando uma rede de comunicações com as características dos indicadores apresentados a seguir.
1. Cálculo das Centralidades
As ligações da rede de estações de um sistema metroferroviário se configuram como uma rede de comunicação. Nesse contexto, um ator é central em uma rede, quando pode comunicar-se diretamente com muitos outros, ou está próximo de muitos atores ou, ainda, quando há muitos atores que o utilizam como intermediário em suas comunicações.
Uma rede de comunicação pode ser representada formalmente através de um grafo. Portanto, com base na Teoria dos Grafos, pode-se utilizar uma técnica de avaliação das estações metroferroviárias, onde a centralidade é um atributo dos elementos representados pelos vértices e sua medida está associada à importância, ao prestígio e à influência de atuação de cada elemento.
Um grafo G = (V, A) é uma estrutura matemática definida por um conjunto V, discreto e finito, cujos elementos v são chamados de vértices ou nós, e por um conjunto A de ligações ou relações de adjacências, designadas arestas, que são pares de elementos (v, w) de V, que guardam alguma relação entre si. A forma como um vértice se relaciona com os demais identifica a sua centralidade, ou seja, o seu poder dentro da rede. Como se verá a seguir, diversos indicadores são utilizados para caracterizar a centralidade de cada vértice.
1.1 Indicadores de centralidade e medidas associadas
Uma medida de centralidade na qual as unidades de centralidade são adicionadas entre os elementos conectados, isto é, à centralidade de um elemento são adicionadas as centralidades daqueles que com ele estão conectados, sendo o cálculo do status ou soma das distâncias entre v e todos os outros vértices de acordo com a expressão:

Onde: dij é a distância (física, temporal ou número de caminhos) entre o vértice i e o vértice j.
Para esclarecer conceitualmente o modelo de centralidade aplicado a uma rede de comunicação social, deve-se distinguir ainda as seguintes centralidades:
a)    Centralidade de informação.
Tem como base a idéia de que o número de relações diretas que um elemento estabelece com os outros (dado pelo grau do vértice correspondente) é um aspecto importante de sua posição estrutural e está associado ao número de interações ou conexões de um elemento em uma rede. A sua importância (posição na rede) está associada ao número de elementos interagindo com ele. Se esse número for elevado aumentam as chances de satisfação de necessidades, diminui a relação de dependência em relação aos outros e aumenta o acesso aos recursos disponíveis na rede. Em uma rede de informações ou de difusão de uma infecção, a centralidade de informação traduz a capacidade de receber uma informação ou de ser infectado (o que indica um eventual aspecto negativo). Na matriz de adjacência do grafo associado à rede, a centralidade de informação pode ser obtida adicionando-se os valores relacionados nas linhas ou nas colunas.
b)    Centralidade de proximidade.
Está associada à rapidez de acesso de um elemento em relação aos outros na rede. O elemento com maior centralidade de proximidade é aquele que se comunica com maior rapidez com todos os outros. Ele é tão mais central quanto menor for o caminho que ele precisa percorrer para alcançar os outros elos da rede. No grafo associado à rede, a centralidade de proximidade corresponde ao inverso da soma das distâncias do vértice em questão aos demais, ou seja, dos valores relacionados nas linhas/colunas da matriz de distância.
Em um processo de difusão, a centralidade de proximidade traduz a rapidez com que uma informação chega a um elemento ou a rapidez com que será infectado.
c)    Centralidade de intermediação.
Informa a dependência relativa de um elemento em relação aos demais, ou seja, tem como base a idéia de que a dependência relativa a um elemento é um aspecto importante de sua posição estrutural e está associada ao número de vezes que um elemento participa quando é estabelecida uma interação pelos menores caminhos na rede. O elemento com maior centralidade de intermediação é aquele que participa mais ativamente num processo de interação, no qual se percorre os caminhos mais curtos.
No grafo associado à rede, a centralidade de intermediação diz respeito ao número gij(v) de caminhos geodésicos entre i e j que passam por um vértice v, relacionado ao número total gij desses caminhos. Em um processo de difusão, um vértice que tenha a maior centralidade de intermediação pode controlar ou facilitar o fluxo de informação, atuando como uma ponte ou servindo de elo entre regiões isoladas na rede.
d)    Centralidade de autovetor.
Tem como base a idéia de que um elemento é mais central se estabelece relações com elementos que também estão numa posição central, o que é um aspecto importante de sua posição estrutural. A centralidade de um elemento é uma combinação linear das centralidades dos elementos com ele conectados. Em uma rede de comunicação, aquele elemento que recebe informações de elementos que são fontes de informação tem uma posição privilegiada.
Seja R = [rij] uma matriz de relacionamento, não necessariamente simétrica e com diagonal principal nula. Então:
2. Estudo de caso: Metrô de Belo Horizonte.
a)    Centralidade de Informação (calculada a partir das Matrizes O/D ferroviárias de 2006 e 2009))


Pelo gráfico apresentando os cálculos da centralidade no ano de 2009, observa-se que as estações com maior centralidades de informação foram: Eldorado, Lagoinha, Central, São Gabriel e Vilarinho. Tirando as duas estações centrais (Lagoinha e Central), as demais retratam a influência da existência de terminais de integração com o sistema ônibus exercem sobre a centralidade. Estas centralidades demonstram a capacidade que estas estações têm de transferir e receber passageiros.
Ao se comparar com o gráfico de 2006, verifica-se uma mudança significativa na centralidade das estações num curto espaço de tempo, com a consolidação do trecho entre Minas Shopping e Vilarinho e o aumento das integrações em determinadas estações. No entanto, observa-se que houve uma maior concentração das centralidades nos pontos terminais, o que até certo ponto indica uma sub-utilização das demais estações no contexto da irradiação do desenvolvimento e aumento do movimento pendular.
b)    Centralidade de Autovetor (calculada a partir das Matrizes O/D ferroviárias)
Possuem maior centralidade nesse indicador, ou seja, as estações que estabelecem mais relações com as outras: Eldorado, Central, São Gabriel e Vilarinho. A seguir aparecem: Calafate, Lagoinha e José Cândido.
c)    Centralidade de Proximidade (calculada com base nas distâncias entre as estações)

A centralidade de proximidade apresenta uma curva bem próxima de uma curva normal. Tomando a variância para os valores de centralidade foi obtido um valor igual a 0,01%, um valor bastante pequeno, o que indica que as distâncias entre as estações são, em média, quase as mesmas. As estações localizadas mais no centro da linha apresentam maior centralidade: Central, Santa Efigênia, Santa Tereza, Horto e Santa Inês.
     d) Centralidade de Intermediação (calculada a partir dos caminhos geodésicos entre estações)
Como no indicador anterior, apresentam maiores centralidades de intermediação, as estações localizadas mais no centro da linha: Central, Santa Efigênia, Santa Tereza,Horto e Santa Inês
3. Conclusões
Estação
Centralidade
Informação
Autovetor
Proximidade
Intermediação
1
Eldorado
14%
11%
3%
0%
2
Cidade Industrial
2%
2%
4%
2%
3
Vila Oeste
3%
4%
4%
3%
4
Gameleira
4%
5%
5%
5%
5
Calafate
5%
7%
5%
6%
6
Carlos Prates
3%
4%
6%
7%
7
Lagoinha
7%
6%
6%
7%
8
Central
10%
8%
6%
8%
9
Sta. Efigênia
4%
5%
7%
8%
10
Sta. Tereza
4%
5%
7%
8%
11
Horto
1%
2%
7%
8%
12
Sta. Inês
4%
5%
6%
8%
13
José Cândido
5%
6%
6%
7%
14
Minas Shopping
2%
3%
6%
8%
15
São Gabriel
11%
10%
5%
6%
16
1° de Maio
1%
1%
5%
5%
17
Waldomiro Lobo
3%
3%
5%
3%
18
Floramar
3%
3%
4%
2%
19
Vilarinho
11%
10%
4%
0%

Pela análise geral, pode-se dizer que a estação mais expressiva em graus de centralidade é a Central, pois sua presença é bastante significativa em todos os indicadores calculados, mesmo naqueles em que ela não se destaca entre as quatro maiores, esteve presente entre os 6 primeiros. A seguir, pelo mesmo motivo, aparece a estação Lagoinha.
A subutilização de muitas estações ferroviárias demonstra na realidade a subutilização da infraestrutura ferroviária existente. Isto é um enorme desperdício de recursos ao se considerar que, próximo à linha do trem, aparecem corredores rodoviários congestionados, com elevados índices de acidentes e as conseqüentes deseconomias associadas a esses fenômenos. Um modelo excessivamente rodoviário potencializa a dispersão das atividades e da mancha urbana, dificultando as soluções relacionadas com a mobilidade da população.
Por outro lado, este tipo de estudo no âmbito da estação ferroviária é um importante auxiliar no planejamento das integrações.

AUTORES
Fernando de S. Bittencourt: Gerente Técnico da Gerência de Planejamento e Estudos de Transporte da CBTU. Economista com cursos de extensão em Financiamento de Projetos de Transporte (FGV-RJ), Avaliação Socioeconômica de Projetos de Trens Urbanos – CEPAL (ONU) / SPI (Ministério de Planejamento) e Transporte e Desenvolvimento Urbano – PET – COPPE/UFRJ.
Marina dos Santos Nascimento: estagiária de estatística da CBTU. Cursando o 6º período da ENCE – Escola Nacional de Ciências Estatísticas (IBGE).
Lilian de Sousa Pires: estagiária de estatística da CBTU. Cursando o 6º período da ENCE – Escola Nacional de Ciências Estatísticas (IBGE).

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