terça-feira, 16 de julho de 2013

O custo da passagem no transporte público

Autor(es): Roberta Marchesi
Valor Econômico - 09/07/2013

As pressões das ruas em relação ao congelamento tarifário e até da "tarifa zero" para o transporte público tem gerado afirmações distorcidas em relação ao custo desse serviço público essencial, o que prejudica o debate sério que essas questões demandam. São poucas as cidades, todas de pequeno porte, que ofertam gratuidade em passagens de ônibus. Na maioria, há apenas algumas linhas circulares em áreas centrais ou ligando áreas comerciais.

Houve várias experiências nos EUA e na Itália. Por exemplo, em Seattle, a gratuidade foi adotada para incentivar o comércio da "downtown" e era subsidiada pelos comerciantes, mas não prosperou. Na Itália, as experiências foram extintas visto que o vandalismo dos usuários e a superlotação ocasionou substancial queda da qualidade do serviço.

Não há caso de tarifa zero para o transporte de passageiros sobre trilhos.

Há metrôs em capitais que estão em construção há 14 anos sem, efetivamente, atender a população.
Ao comparar custos de transporte, é comum olvidar-se de alguns aspectos fundamentais e que diferenciam os sistemas sobre trilhos de quase todas as empresas congêneres. No caso do Metrô de São Paulo, por exemplo, é possível circular em quaisquer de suas linhas, sem cobrar tarifas extras.

Assim, atualmente, com uma única tarifa de R$ 3 é possível acessar a rede e circular o dia inteiro, por todas as linhas. Além disso, em vários terminais de integração, é possível fazê-lo também com os trens metropolitanos, atingindo 22 municípios e podendo acessar 335 km de meios sobre trilhos, sendo 75 do Metrô e 260 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos - CPTM. O Metrô de SP ainda integra-se com os ônibus municipais e intermunicipais, pagando-se um diferencial tarifário de R$ 1,65 por viagem. Os ônibus municipais, por sua vez, cobram R$ 3 ao se entrar no primeiro ônibus, podendo-se, durante três horas, usar até quatro ônibus, metrô ou trem.

Outro aspecto que não deve ser esquecido e pode, erroneamente, desaguar em interpretações falsas é como as tarifas são cobradas. Comparar tarifas unitárias dos vários sistemas sobre trilhos do mundo como uma tentativa de buscar uma justificativa para criticar o sistema no Brasil é, no mínimo, um equívoco, ou pode-se até suspeitar de má fé. Deve-se, obrigatoriamente, considerar o tipo de cobrança. Há três principais: por distância (Hong Kong, Bangkok, Cingapura, Sidnei, Taipei, Delhi, Newcastle etc.); por zona (Londres, Madri, Barcelona etc.) e a chamada tarifação "flat", que independe da distância a ser percorrida pelo usuário (São Paulo, Rio de Janeiro, Santiago, Paris, Berlim, Nova York, Lisboa, Nápoles, Buenos Aires, Toronto, Montreal, Milão etc).

Uma maneira honesta de comparar a tarifa é considerar um indicador que represente, na média, o que cada usuário ("entrada") despendeu para compor a receita tarifária. Além disso, as conversões das diferentes moedas devem ser equalizadas. Uma das conversões mais apropriadas é a utilização do dólar PPP (Power Purchase Parity - World Bank). Em 2011, considerando este indicador e comparando esses metrôs citados, por meio de dados primários fornecidos pelo CoMET, associação dos mais destacados metrôs do mundo, conclui-se que o principal metrô brasileiro - o de São Paulo - situa-se na faixa intermediária, ou seja, há 12 dos metrôs mencionados anteriormente com uma tarifação mais cara.

Em nenhuma cidade de grande porte ou nos países com modelos de transporte público consagrados, os meios de financiamento do custeio adotaram tarifas nulas e a falta de recomposição tarifária gera graves problemas, como o que aconteceu na Cidade do México. Por decisão política, as tarifas cobradas permaneceram muito baixas - 1 peso -- por um longo período, inibindo investimentos em conservação e manutenção.

No caso do transporte por ônibus no Brasil, o seu encarecimento está nos engarrafamentos. Em São Paulo, a velocidade média do trânsito é de 13 km/h; no final dos anos 80 era de 27 km/h. Resultado: o custo operacional dos ônibus mais do que duplicou.

Há mais de 60 projetos de transporte sobre trilhos em execução no Brasil. Com raras exceções, não produzem resultado algum, a não ser o desembolso de recursos. Há metrôs em capitais que estão em construção há 14 anos sem, efetivamente, atender a população. Espera-se que 22 desses projetos estejam prontos até 2016 e os demais até 2020, quando então terão sido aplicados R$ 100 bilhões em investimentos.

Nos sistemas de transporte sobre trilhos em funcionamento, a demanda cresceu 37% entre 2010 e 2012, chegando a 9 milhões de passageiros/dia, dos quais 75% estão em SP. Dos 1.208 km de meios de transporte de passageiros sobre trilhos instalados no Brasil, 335 km estão em SP. Os atuais 75 km de linhas de metrô estão sendo ampliados em 55 km. No ano que vem, serão sete frentes de construção de metrô simultâneas, significando quase 100 km de novas linhas, envolvendo quase R$ 39 bilhões de investimentos. Outras seis linhas de trens metropolitanos da CPTM serão modernizadas. Em 2013, estima-se que se chegará aos 10 milhões de passageiros/dia transportados sobre trilhos. Ou seja, até a Copa de 2014 o Brasil elevará em 50% o número de passageiros transportados sobre trilhos em relação a 2010.

Esse ritmo de construção é destacado mundialmente como sendo o maior investimento simultâneo em transporte sobre trilhos em uma única cidade. E é no Brasil, na cidade de São Paulo.

Roberta Marchesi é gerente executiva da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), Mestre em economia e pós-graduada nas áreas de planejamento, orçamento e logística.


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