quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Cálculo de passagens de ônibus intermunicipais e metrô tem falhas

O GLOBO ON-LINE 26/02/2014

RIO - A voz das ruas ecoou no plenário do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Duas auditorias aprovadas nesta terça-feira, em sessão plenária do órgão, mostraram a situação de descontrole público sobre o serviço prestado pela concessionária do metrô e pelas empresas de ônibus intermunicipais do estado e os seus efeitos no valor das tarifas. O sistema que deveria fiscalizá-las, protegendo o interesse de 69 milhões de passageiros transportados mensalmente, não funciona como deveria. O Departamento Estadual de Transportes Rodoviários (Detro) e a Agência Reguladora de Transportes (Agetransp) aceitam, sem checar, e usam como parâmetro para cálculo das tarifas as informações fornecidas pelas concessionárias, concluíram auditores do TCE.

- Os auditores encontraram uma situação de caos. Tudo que os órgãos fiscalizadores fazem é homologar as informações das concessionárias. Não tenho nada contra a empresa privada nem contra o lucro. Mas transporte é um serviço público e precisa ser bem prestado - disse o presidente do TCE, Jonas Lopes Carvalho.

Uma das auditorias tratou da relação do Detro com as empresas de ônibus. A outra analisou como a Agetransp monitora a operação do metrô. O TCE descobriu, por exemplo, que o Detro concedeu, em 2009, um reajuste para as empresas de 7,05%, valor acima do que recomendavam as avaliações técnicas (2,68%) para os veículos do tipo "frescão". Além disso, a fórmula de cálculo da tarifa manteve os custos de encargos trabalhistas, que, desde 2011, não são mais cobrados. Técnicos constataram ainda que alguns reajustes são concedidos com base em parâmetros de 20 anos atrás, ignorando, por exemplo, que pelo menos um terço da frota é de micro-ônibus e não utiliza cobradores.

Benefício não reduz tarifa

No caso da concessionária metrôRio, os auditores concluíram que a Agetransp deixou de multar a empresa por não ter cumprido metas de qualidade do serviço prestado ao usuário. Muito menos promoveu revisões tarifárias, apesar de os custos de operação terem caído porque a concessionária também foi beneficiada por incentivos fiscais.

Na caixa-preta dos transportes, o TCE criticou o descontrole sobre as receitas acessórias, com a venda de espaço publicitário, aluguel de quiosques e outras fontes de lucro. Os itens poderiam contribuir para a redução das tarifas (de ônibus e metrô), mas não são levados em conta pelas empresas.

Em relação ao transporte sobre trilhos, o relatório levanta dúvidas sobre a prestação de contas de um crédito que o estado teria direito a receber, estimado em R$ 350,5 milhões. O valor corresponde a uma contrapartida à renovação da concessão do metrô por mais 20 anos (até 2038). Do total, apenas R$ 40 milhões foram pagos pelo metrôRio, em 12 parcelas. Os outros R$ 310,5 milhões ficaram para um acerto de contas. O crédito tem sido usado para ressarcir a concessionária pelas gratuidades e por ter arcado com dívidas trabalhistas e tributárias da extinta Companhia do Metropolitano.

- Gratuidades e subsídios são importantes. Mas cadê a conta? Por que temos de aceitar as informações sem fiscalizá-las devidamente? A obrigação do estado é fazer esse papel - questionou Jonas.

As auditorias apontaram outros problemas. Apesar de toda a frota de ônibus ser equipada com GPS, o sistema é subutilizado como recurso para fiscalizar as empresas, por falta de um software que gerencie as informações. O órgão também constatou que 87 empresas operam 1.149 linhas. Mas apenas seis linhas foram alvo de concorrência pública. Manobras judiciais impedem as demais licitações. Por conta disso, o TCE determinou que o secretário-chefe da Casa Civil, Regis Fichtner, agilize as concorrências.

Na sessão desta terça-feira, o TCE aprovou notificações e determinações para o Detro e a Agetransp. Cópias dos relatórios foram enviados ao Ministério Público.

O último reajuste das linhas intermunicipais ocorreu no dia 2 de janeiro, quando as passagens subiram 5,24%. No mesmo mês, o governador Sérgio Cabral concedeu novos benefícios fiscais para as empresas. Elas passaram a ter um desconto de 50% no IPVA. A Agetransp ainda não analisou pedido de reajuste anual da tarifa do metrô.

Metrô diz que cumpre contrato

Em nota, o Palácio Guanabara afirmou que os estudos para a concorrência já terminaram. E se limitou a afirmar que "a licitação será realizada oportunamente". Ainda disse desconhecer qualquer orientação do TCE para proceder a revisões tarifárias. Já o Detro argumentou que mudou os parâmetros para cálculo da tarifa por recomendação do MP. "Dotar as planilhas de insumos, ao invés do IPCA, acarretaria não a diminuição nos atuais preços das passagens, mas sim um aumento", alegou, por nota. O órgão também argumentou que, apesar de as linhas intermunicipais operarem longas distâncias, a tarifa de R$ 2,80 é uma das mais baixas do país.

A Fetranspor, que representa as empresas de ônibus, preferiu não se manifestar por não ter sido citada pelo TCE. A Agetransp informou que só vai se pronunciar após ser notificada. Em nota, o metrôRio alegou que cumpre as obrigações previstas na concessão. "Até o presente momento não recebemos quaisquer questionamentos do TCE", informou em nota.

A aprovação dos relatórios ocorreu na véspera de a Alerj votar, em última discussão, projeto de Cabral que estende à supervia e ao Metrô subsídios já concedidos para a CCR Barcas e empresas de ônibus. Com a medida, o governo quer estender os descontos do Bilhete Único para outros transportes, arcando com parte dos custos.

- O problema é que o benefício será concedido sem qualquer auditoria independente que demonstre quanto as empresas faturam de fato. Será um subsídio presumido, não em cima de algo controlado - disse o deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), que votará contra o projeto.

*Colaborou Luiz Ernesto Magalhães

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